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Eu quero comprar, bolar e fumar um tabaco. Mas prometi não comprar mais. Então, acho que vou pausar rapidinho a escrita da coluna – que já tá atrasada – pra fazer um café com leite. Vai me ajudar a pensar. Ou, na verdade, eu queria mesmo era que aquele uber, frequentador de festas de swing, que eu conheci no carnaval passado, me respondesse. Ou até seja melhor ele me ignorar. Acho que tô confusa. Tô ignorando o espelho porque eu engordei nas últimas semanas. Tava fugindo dos sentimentos, enfiando merda goela abaixo. Não deu certo. A dor tá aqui ainda. Acho que vou comprar um aspirador de pó robô. Vai que ele aspira a dor mesmo. Vou gastar todas as minhas economias, mas eu quero muito. Eu quero preencher esse vazio aqui.

Fiz o café. Será que tô evitando escrever o que realmente quero dizer? 

Leitor aí do outro lado, quero te dizer que essa história de fugir da dor já matou muita gente. Desde a morte dos cartões de crédito, até a morte literal pelas drogas, álcool, distúrbios alimentares e violência dos relacionamentos abusivos. 

Sem querer me vitimizar, mas eu sofro muito com essa história. A comida é meu refúgio mais confortável. Tampouco quero me responsabilizar – vide meus pincéis secos há meses – mas, meu papel aqui é simplesmente explicar o que aprendi na terapia (valeu, Lacan): 

Comer, fumar, malhar, transar, beber, comprar, jogar, ou qualquer atividade que você utilize para fugir dos sentimentos, são maneiras não saudáveis de lidar com a falta.

A falta, em essência, é aquele sentimento quase-que-constante de que “tem um vazio no meu peito” ou “tá faltando algo aqui pra eu ser feliz de verdade”. E, quando não fazemos algo para dar forma a esse vazio, ele se transforma em angústia. E a angústia corrói. Por isso, muitas pessoas (eu inclusa) utilizam comportamentos nocivos para aliviar toda essa pressão. Simplesmente por não terem outras ferramentas psicológicas pra dar vazão a isso. 

Identificou-se, leitor?

Pausa pra dar um gole no café. Já acabou e eu nem vi.

Calma, que a parte animadora da coluna chegou: é possível desenvolver maneiras saudáveis de lidar com os sentimentos. A minha é a arte. Quando tenho coragem – porque haja coragem! – de enfrentar as minhas verdades, eu escrevo, pinto, rasgo, colo e transformo tudo que é inconsciente em algo real e palpável. É uma catarse.

Ca-tar-se

Substantivo feminino

(do grego khatársis, purificação)

Na filosofia, a catarse é um “fenômeno estético de caráter libertador”. Ou seja, é um estado de serenidade alcançado após a expurgação das emoções negativas, causada no momento em que o humano vê seus próprios sentimentos perturbadores sendo refletidos e representados fora de si – por meio da poesia, do teatro, da pintura, etc. É basicamente aquele sentimento gostosinho que vêm depois de chorar com um filme triste. 

Já na psicanálise de Freud, a catarse serve como um processo de cura emocional, alcançada através da expressão verbal das experiências traumáticas. Ou seja, “bota pra fora que passa”.

Pra mim, que não sou nem filósofa nem psicoanalista, e que já estou incomodada com a caneca de café vazia aqui do meu lado, a catarse acontece quando decido molhar os pincéis e dar forma ao meu vazio. Não é sobre preenchê-lo, mas sim transferi-lo. O resultado final pouco importa, pois a angústia diminuiu. Respiro.

E é por isso que você, leitor – que eu espero que ainda esteja lendo – também pode catarsizar. Seja por meio da arte, da meditação, dos esportes, ou qualquer outro hobby que te coloque no estado de “flow” (sabe quando você se dedica a uma atividade por horas a fio, sem perceber o tempo passar, como se a sua essência simplesmente estivesse fluindo pra fora do corpo?). Essa é a sua catarse.

Essa coluna vem pra me apresentar. Tenho problemas de coluna, me chamam de Catherine, sou artista e publicitária (por que teatro não dá dinheiro). Eu criei um instagram chamado @catartse e, por mais bizarro que isso me pareça, as pessoas começaram a comprar as minhas catartses. E agora eu tô aqui, no journal48, pra compartilhar com você qual foi o vazio que inspirou cada uma de minhas obras. 

E você? Qual a sua maneira (saudável e não saudável) de lidar com a angústia?

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Catherine Ehler Derviche
Catherine Ehler Derviche
3 anos atrás

Não me deixem falando sozinha, leitores! O que vocês acharam da temática da coluna? Hehe