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Sentir o frescor de um beijo, de um abraço, de um carinho melecado… ai, quem é que não gosta? Salientes peles que dançam e roçam intensamente, num transe rítmico que aflora do improviso, do jogo e da curiosidade mútua… Hmm, me gusta.

Quando se tem desejo, o cheiro, o toque, o sabor, enfim, todos os sentidos podem ser poderosas vias de prazer. No entanto, cada pessoa manifesta um tipo de curiosidade corporal. E cada corpo forma suas zonas erógenas de maneira única. É por isso que, no jogo do sexo, as regras não estão, a priori, declaradas. Os gostos e os limites não são visíveis a olho nu.

E se aquele deslize macio de repente se transforma em um duro e seco atrito? E se a carícia se transforma em um tapa? A repentina agressão física no momento do sexo pode ser um assunto descomplicado para muitos, mas a verdade é que algumas pessoas travam diante dessa surpresinha.

Há quem considere seriamente que essa é uma daquelas coisas que só podem ser feitas mediante consentimento. Ou seja: se nada foi combinado antes, não há por que fazer. Do outro lado, há também quem considere o susto algo especialmente excitante e, inclusive, solicite mais tapas.

De qualquer modo, o fato é que, apesar de em muitos momentos as fronteiras entre dor e prazer não serem fáceis de definir, existe a possibilidade de uma formalização arbitrária sobre o tipo de toque que se pode ou não implicar em alguém.

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Por exemplo, no BDSM, sigla que denomina um conjunto de práticas sexuais envolvendo bondage e disciplina, dominação, submissão e sadomasoquismo, existe uma máxima que norteia os praticantes: todo jogo deve ser “são, seguro e consensual”.

Me lembro de uma situação que vivi no terceiro ano da faculdade de Psicologia. Era 2015. Estava no banheiro com uma caloura, na época, minha amiga. Ela me puxou para uma das cabines e abaixou as calças. Suas nádegas estavam cheias de hematomas. Naquele momento, fiquei perplexa. Eu estava tendo uma visão tridimensional, ao vivo e em cores, daquelas fotografias de internet que muita gente encontra em fóruns e blogs eróticos e nunca acha que vai ver pessoalmente.

Antônia, nome fictício da minha antiga amiga, tinha praticado sexo no dia anterior com um colega de faculdade. Percebi o quão extasiada ela estava em me mostrar aquilo, como se o resultado visual de seu corpo fosse similar a uma conquista – e certamente o era, pois é assim que operam alguns fetiches.

Se você quiser se aventurar na pesquisa, facilmente vai encontrar comunidades que compartilham o gosto pela prática do “spanking” que, do inglês, significa tanto “espancamento” quanto “palmada”. Porém, quando se trata de sexo, as pessoas nem sempre declaram os seus gostos abertamente e muitas dessas comunidades funcionam de maneira silenciosa, anônima e dispersa.

E isso certamente interfere em um encontro sexual. Quando uma das partes não esclarece sobre suas buscas e restrições, a outra parte fica, de certa forma, à mercê da surpresa. E, se as duas, ou quem sabe até mais partes, não esclarecem, a situação fica ainda mais complexa e propensa a passar por algum constrangimento ou mal-entendido.

Tudo bem que uma excessiva detalhação no acordo prévio ao sexo pode deixar o clima um tanto truncado, sem espontaneidade. Parte da graça no sexo consiste também na sua imprevisibilidade. No entanto, uma pitada de diálogo é sempre uma boa pedida. E o diálogo vai além da palavra; está também no gesto, no toque e no olhar.

Declarar-se parte de uma comunidade, ou meramente declarar-se alguém que tenha certos gostos ou adote certas práticas durante o sexo pode ser um desafio. A depender do contexto, o resultado pode culminar na sensação de alívio, acolhimento e pertencimento. Assim como também pode culminar em estranhamento e estigma. Afinal, nem todos são receptivos àquilo que consideram diferente. Mas aí fica a pergunta: vale a pena tentar investir em uma conexão com alguém que te julga?

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