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Nos últimos meses, a foto do rosto de uma idosa de 92 anos, que pertencia ao arquivo de um artigo acadêmico publicado pelo Journal of the European Academy of Dermatology and Venereology, viralizou nas redes sociais. O motivo é simples: ela costumava passar protetor solar no rosto, mas não no pescoço, tornando a diferença da pele nas duas regiões muito visível. 

Mulher que usou filtro solar no rosto por 40 anos, mas não utilizava o produto no pescoço. Foto: C. Posch/ Journal of The European Academy of Dermatology and Venereology

Cuidar da pele, considerada o maior órgão do corpo humano, para além da estética, é, também, uma questão de saúde. A dermatologista especializada em nutrologia, Rafaella Lutfi, explica que a primeira orientação para os pacientes é sempre optar pelo protetor solar como cuidado primordial. “Nós sabemos que esse item é algo bem debatido. A proteção solar previne não só o câncer de pele, mas o nosso envelhecimento precoce”. A quantidade ideal, segundo ela, equivale a uma colher de chá cheia para o rosto e três colheres de sopa cheias para o corpo, não esquecendo das regiões do pescoço e da orelha.

Ela também fala que outros procedimentos importantes devem ser levados em consideração, como uma limpeza diária adequada com os produtos indicados para cada tipo de pele e, pelo menos, uma vez ao ano realizar uma consulta dermatológica para uma avaliação individual. “Nós sempre precisamos avaliar as lesões, as pintas – principalmente, as suspeitas – para que possamos ter um acompanhamento preventivo”, completa. 

Além desses, outro fator bastante importante mencionado pela profissional é a hidratação oral por meio da injestão de 2 a 3 litros de água por dia, algo que as pessoas esquecem, mas que faz muita diferença. A médica também lembra da importância do sol, que faz diferença não só porque traz felicidade, mas também porque ajuda a repor a vitamina D. “Só que é necessário ter muito cuidado”, ela afirma, “principalmente as pessoas com peles mais claras. O tempo suficiente de exposição ao sol é de 10 minutos por dia”. 

A jornalista Marina Mori, que lida com a chamada pele atópica e tem uma página no instagram para abordar o assunto, fala sobre os cuidados com a pele como um passo de sobrevivência em sua rotina. “Durante muitos anos, desde a minha adolescência, eu basicamente passo creme como o passo número um porque, se eu não cumprir isso, eu não consigo nem mexer meu rosto direito, por exemplo. Minha pele resseca e repuxa”, explica. Para ela, os produtos mais adequados são aqueles que não geram coceira nem ardência. 

“De forma geral, os atópicos são pessoas com muita tendência a ter alergia por conta da pele mais fragilizada. A dermatite atópica é uma doença inflamatória crônica hereditária e acontece quando a barreira da pele é fragilizada e não tem as ceramidas de uma pele saudável”, esclarece a jornalista.

As ceramidas às quais ela se refere funcionam como se fossem ‘cimento em uma parede de tijolos’, ajudando a proteger a pele contra os agressores externos, além de hidratá-la. “Como eu não tenho essa proteção, isso faz com que minha pele seja mais sensível, então ela resseca mais fácil e, consequentemente, dá mais coceira, inflamação e feridas”. 

Segundo Marina, a rotina que mais funciona para a pele dela é lavar o rosto de manhã e à noite antes de dormir com um produto de limpeza que seja bem suave, além de passar hidratante e filtro solar diariamente. Juntamente a isso, ela faz tratamento para acne, mas tudo com acompanhamento médico, que garante o entendimento de até onde ela pode ir para não piorar ao invés de melhorar os resultados. 

SAÚDE MENTAL: PELE X REDES SOCIAIS

O caso de Marina é um exemplo de que cuidar da pele é uma necessidade para a manutenção da saúde. Mas a recente popularização de filtros em redes sociais, além de toda a exposição por conta delas, tem levado algumas pessoas do cuidado para o exagero e é inevitável falar sobre saúde mental nesse contexto.

“Com a questão das mídias sociais nós vemos muitas pessoas usando os filtros e isso não é um problema, mas o hábito do uso faz com que a pessoa acabe não conseguindo mais tirar fotos e não se reconheça sem eles. Nós não temos uma pele perfeita, temos pequenas lesões, manchas e poros abertos, isso é natural, o fato é que temos que cuidar. Quando chega ao ponto da pessoa não se reconhecer sem o filtro, isso pode significar um problema sério de saúde mental”, alerta a dermatologista Lutfi.

O uso excessivo dos filtros e do photoshop em redes sociais contribui para uma realidade que não é novidade no Brasil: a das cirurgias plásticas. O país é, atualmente, líder mundial na quantidade desses procedimentos, realizando aproximadamente 1,5 milhão de cirurgias por ano, segundo a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS).

A mesma entidade também contabilizou que, em 2020, ano em que o Brasil havia sido superado pelos Estados Unidos no ranking, o país seguiu com o maior número de procedimentos estéticos na face e cabeça, totalizando 483,8 mil. A cirurgia de pálpebra foi a mais realizada, com 143 mil registros, seguida pela rinoplastia, com 87,9 mil. Além disso, no mesmo ano, o Google Trends, que monitora as tendências do buscador, indentificou um crescimento de 540% nas buscas pelo termo “harmonização facial”.

Esse último procedimento, segundo Rafaella Lutfi, pode comprometer a sensação de individualidade das pessoas, já que tem como objetivo a padronização da face. “Os procedimentos estéticos são excelentes na medida que ajudam a melhorar a autoestima do paciente, mas nós precisamos individualizar e conversar com o paciente para ver se realmente o que ele quer é algo natural e compatível com o biotipo dele ou se está almejando algo irreal”, diz a profissional. 

Ela afirma que esse contexto pode desencadear casos de dismorfismo corporal, que é quando a pessoa não se enxerga do jeito que é. “Por isso precisamos tomar muito cuidado”, alerta, “não é saudável para a nossa mente acreditar em algo que não existe porque passamos a enxergar só defeitos ao invés de valorizarmos o que podemos ter de melhor”.

Em contrapartida ao excesso de filtros e edições de fotos, ter momentos de autocuidado com a pele pode desencadear uma positiva relação com a saúde mental. “Nós vivemos sempre na correria, muitas vezes não paramos para respirar ou tomar uma água, então ter um tempo para você no dia é essencial. Hoje vemos um aumento do burnout e do estresse, então ter esse tempo para você seja no cuidado com a pele, fazendo uma atividade física ou meditando é algo essencial para ter qualidade de vida”, completa Lutfi.

PRODUTOS NATURAIS: SEGMENTO EM ASCENSÃO

É impossível falar sobre cuidados com a pele sem mencionar o crescimento do mercado dedicado aos produtos feitos com ativos vegetais, ou seja, aqueles que usam matérias primas naturais sem uso de substâncias químicas e que não fazem testes em animais. 

“Além da questão ecológica, os produtos naturais realmente são benéficos para a saúde. Os produtos industrializados têm como ingredientes substâncias químicas, como petrolatos e parabenos, que são considerados disruptores endócrinos – moléculas que confundem os nossos receptores endócrinos e fazem uma bagunça no sistema metabólico e hormonal. Até alguns alimentos podem ter essa substância em sua composição e isso pode levar a problemas desde obesidade a distúrbios psicológicos”, explica a dermatologista.

A gerente de comunicação Ana Vicente é co-fundadora da Trópica Botânica, marca dedicada a produtos naturais. Ela explica que o objetivo da empresa é “pensar os ingredientes de forma mais ampla e mais integrativa para além do impacto no nosso corpo. Isso significa que temos que olhar para o percurso das matérias primas, desde a produção até o descarte. Isso amplia a nossa consciência a respeito de um produto e faz com que nossas escolhas tenham impacto mais positivo em toda a cadeia de produção”. 

Os ingredientes naturais são muito biocompatíveis com o nosso organismo e só isso já faz com que eles tenham potencial de melhoria para o nosso bem estar. “Se pensamos nos rituais de uso durante o cotidiano, esses pequenos hábitos são muito benéficos e nós podemos encaixá-los dentro da nossa própria rotina. A cada banho ou a cada massagem com óleos faciais, ter esse momento para prestar atenção na nossa pele. Ressignificar esses momentos que geralmente são feitos no automático pode ser uma fonte para melhorar a qualidade de vida”, complementa Ana. 

Assim como os demais produtos, nem todos os naturais vão ser compatíveis com todas as pessoas, esclarece Rafaella Lutfi. O óleo de coco, de acordo com ela, é um grande exemplo disso: “apesar dele ser antimicrobiano e antifúngico, nós precisamos ter um certo cuidado no uso dermatológico dele. Alguns tipos de pele não se adequam ao óleo de coco por ele ser comedogênico, ou seja, formar comedões e propiciar acne, então pessoas com peles mais oleosas e tendência à espinha devem evitá-lo”, explica.

“Dessa forma, entender sobre a própria pele e realizar frequentes consultas com profissionais da área são passos determinantes para a contrução desse processo de autocuidado e autoconhecimento”, finaliza a profissional.

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