Um Brasil paralelo, o bobo e sua corte

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Em um discurso bastante voltado à sua pequena, ainda que fiel, base de apoiadores – equivalente a 22%, de acordo com o último levantamento do Instituto Datafolha, publicado este mês -, Bolsonaro se fez de bobo no palco internacional das Nações Unidas e nós, sua corte, assistimos envergonhados uma contação de mentiras enfadonhas e dados distorcidos sobre a atual situação do Brasil.  

Travestida de eloquente e diplomática, a fala do presidente – a quem, diga-se de passagem, geralmente faltam boas maneiras – nada mais foi do que fonte para memes e críticas internacionais na última semana. Diferentemente da imagem de peso e mediadora de conflitos atribuída ao Brasil (e motivo pelo qual somos incumbidos do discurso de abertura na Assembleia Geral da ONU), Bolsonaro não se poupou (nem nos poupou) ao deturpar tópicos referentes ao desmatamento e ao auxilio emergencial.  

Isso sem falar do total descaso à pandemia que, apesar de ser a maior urgência internacional do momento, só foi trazida à tona pelo presidente depois de nove minutos de baboseira, de um total de doze. Da defesa do “tratamento” precoce – entre aspas porque não é, de fato, tratamento – à culpabilização dos governantes estaduais e municipais pela crise sanitária-financeira, ouvimos mais do mesmo: Bolsonaro não se responsabiliza pelos quase 600 mil óbitos por coronavírus no país; critica a regra do passaporte sanitário, sendo o único líder do G20 assumidamente não vacinado; e defende em plenos pulmões o direito à liberdade individual em um momento e situação nos quais ela ameaça a liberdade coletiva.  

Não é para menos que políticos Brasil afora taxaram o episódio de vexame, ficção e delírio. O Brasil de Bolsonaro e seu pequeno cercadinho definitivamente não é o mesmo que o que passou, na temporada 2020/2021, pelo maior desmatamento na Amazonia da última década; também não é o mesmo que o que enfrenta a pior crise hidrelétrica dos últimos 90 anos. Para o presidente e sua trupe de alienados, o dólar não tem fechado semana após semana em alta e isso não afetou as refeições do dia a dia – será que algum deles precisou almoçar feijão bandinha com ossos hoje? 

Além disso, nenhum bolsonarinho está envolvido em rachadinhas, a CPI da Covid-19 não investiga esquema de propina na compra de vacinas e todas as possibilidades de adquirir mais imunizantes para a população foram acatadas no ano passado. Tudo isso porque neste governo não há corrupção ou negacionismo. (Risos).  

Difícil enxergar e compreender esse Brasil paralelo no qual vivem os 22% e seu Messias. Igualmente tortuoso é pensar no trabalho que futuros chefes de Estado terão que desempenhar para reestabelecer o respeito de nossa nação aos olhos da política Internacional, já que, ao invés de se portar como um estadista disposto a proporcionar soluções para as demandas globais, Bolsonaro escolheu falar bonito para render elegantes cortes às suas redes sociais.  

A curto prazo é disso que ele precisa, afinal, há pouco mais de um ano das eleições presidenciais de 2022, ainda sem partido e com a pior rejeição desde o início de seu mandato, o “mito” terá que manter seu cercadinho fechado às sete chaves para candidatar-se à reeleição com algum peso.  

Já a longo prazo, coisa que Bolsonaro é incapaz de visualizar para o país, sob sua (des)governança, estamos fadados a uma política medíocre e motivo de chacota internacional. Se no palco da ONU ele é o bobo e nós sua corte, somos, então, igualmente péssimo entretenimento.